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Crítica – Quando Eu Era Vivo (2014)

by on fevereiro 25, 2014
 

O gênero de terror aqui no Brasil quase nunca é explorado. Claro que temos clássicos, como “À Meia-Noite Levarei Sua Alma” do cineasta José Mojica Marins, mas nem esses são bem vistos pelo grande público. Mojica, também conhecido pelo seu personagem Zé do Caixão, é celebrado no exterior, enquanto em terra brasilisis, muitas vezes é motivo de chacota. Vai entender. Qual é o nosso problema com o horror, o terror e o suspense? Temos medo desse gênero? O brasileiro só curte comédias? As igrejas evangélicas não aprovam? Seja qual for à resposta, é sempre bom ver quando alguém se aventura por esse terreno não muito explorado de nossa cinematografia.

Quem nos agracia com mais uma abordagem ao mundo do horror brasileiro é o jovem diretor Marco Dutra, paulista de 34 anos. Ele já havia perambulado por esse gênero com o longa “Trabalhar Cansa”, esse com um viés social, que chegou até ser selecionado para a mostra “Um Certo Olhar de Cannes”. Agora Dutra aborda o sobrenatural com o filme “Quando Eu Era Vivo”, baseado no livro “A Arte de Produzir Efeito Sem Causa” de Lourenço Mutarelli.

Nessa obra acompanhamos Junior, interpretado magistralmente por Marat Descartes, um rapaz que esta na merda. Perdeu o emprego, se separou e a mulher ficou com a casa e o filho. Sem escolha, ele volta para a casa do pai, Senior, vivido por Antonio Fagundes, um apartamento onde passou a infância com sua família. Senior redecorou tudo depois da morte da esposa e, ainda, colocou uma inquilina para morar no quarto antigo do filho, a estudante de música Bruna, papel de, por incrível que pareça, Sandy Leah. E sim, é a Sandy do Sandy & Júnior. E não, ela não estraga o filme.

Aos poucos Junior começa a experimentar um estranho processo de regressão. Fica obcecado com sua infância, principalmente com os rituais que a mãe realizava, tem vários sonhos com o irmão ausente e sempre busca recordações materiais de sua vida antiga. Lentamente ele consegue deixar a casa como era, para o desgosto de seu pai. Para piorar, Junior vai adquirindo um comportamento arisco, infantil e misterioso. Chega em um ponto que Junior não passa a reconhecer mais seu pai como pai. Senior não sabe muito como reagir a obsessão pelo passado do filho, alias ele nega o passado com todas as forças. E não podemos nos esquecer de  Bruna, uma garota com ar inocente, que num primeiro momento parece ser um elemento perdido nessa história, ou seja, mais elemento estranho no conturbado universo de Junior. Como Senior irá resolver o problema de seu filho? Há algo além de birra no comportamento do rapaz? Tem haver com a falecida mãe de Junior? Há alguma solução?

O terror aqui não é aquele do grito, das aparições surgindo do nada ou violência gratuita. Aqui Marco Dutra investe no suspense psicológico e no desconforto. O filme tem um ritmo lento, as passagens, principalmente quando Junior tem um flashback, são lentas e às vezes parecem se prolongar mais do que o necessário. É um longa que exige paciência, muitas cenas que no primeiro momento parecem que não vão para lugar nenhum, estão ali para um revelação posterior ou para criar o ambiente de desconto e de que há algo estranho naquele local. A estranheza é algo presente em toda projeção. Logo no começo do longa, por exemplo, quando Junior ainda nem subiu para seu antigo lar, a conversa dele e do pai na portaria tem como pano de fundo os gritos do maluco da rua, algo “simples” mas funcional para ditar para onde iremos a partir dali.

Esse longa traz uma sensação de claustrofobia pela história ser quase toda passada num apartamento, sentimento que piora no decorrer da narrativa, pois a iluminação do local vai ficando mais precária. O filme pega emprestado vários elementos do terror gringo, principalmente do filme “Atividade Paranormal”. É impossível não se lembrar desse longa de sucesso na sequência de VHS, mas aqui o sobrenatural é ainda mais discreto e o desconforto vem mais pela sugestão do que vemos na tela.

Com muitas limitações, devido a seu baixo orçamento, “Quando Eu Era Vivo” mesmo assim é um bom filme de terror e suspense. Demora um pouco para engrenar, há passagens que podem testar sua paciência, mas caso você passe por essas barreiras, será recompensado com um mistério que irá manter sua atenção até o fim. Resumindo, você tem que estar no clima para uma experiência diferente e que exige mais concentração. Esse é um longa que mostra que o cinema brasileiro ainda tem muito o que mostrar, ainda mais se expandir sua área de atuação para além das comédias e os filmes policiais/crimes. Que venham mais produções corajosas como essa.

Nota: 4/5

Trailer desse longa nacional tão único

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